REVOLTADO
Inteligência, privilégio de poucos.
Edgar Rodrigues *
Ao consultar sites de notícias da Internet, como o faço cotidianamente, deparei-me com uma entrevista concedida pelo jornalista Volney Oliveira, presidente atual do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Amapá, sobre o exercício do Jornalismo. Até aí tudo bem. Só fiquei surpreso a partir da metade da entrevista, e do título um pouco maldoso, em que ele afirma que “só não estuda quem é preguiçoso”. Até aí, genericamente ele está correto. Mas seu raciocionio começa a oscilar, quando infere essa questão ao fato da presença do ministro do Trabalho que esteve aqui no Amapá, e o encontro que ele, o ministro, teve com a classe de jornalistas sem diploma, que pediram auxilio ao mandatário máximo do trabalhismo no país, em razão da irredutibilidade do mesmo dirigente sindical, que quer negar a renovação dos registros provisionados a jornalistas que, muito embora estejam há décadas no exercício da profissão, e muitos com 5 ou 6 registros já vencidos, não têm diploma universitário.
Notória a desinteligência (esse é o termo mais elegante nesse momento) e a falta de informação desse dirigente sindical, que fecha o leque de vários (a maioria) companheiros de jornais, do rádio e da TV, à continuação do exercício profissional, simplesmente porque a maioria não tem diploma.
Também esquece o senhor Volney que para continuar na profissão não é necessária a filiação a uma entidade sindical, tampouco a autorização desse sindicato para dizer se o fulano ou beltrano merecem continuar a ser profissionais e a desempenhar seu exercício cotidiano que há décadas alimenta a família, dá o pão aos filhos e ajuda a comunidade a ter sua história registrada nas crônicas do dia-a-dia dos jornais.
Torna-se claro aqui, até mesmo para não tornar incompreensível ao senhor presidente do Sindjor, que a questão não é o diploma. Muitos profissionais que já realizaram o curso, estão aí no mercado de trabalho, e transitam entre a gente, sem algum problema ideológico ou cultural, pois sabendo que a práxis é a complementação da Teoria, e uma não vive sem a outra, todos concordam com o grande escritor Adous Huxley quando afirma que “Nem a melhor receita de comida substitui o pior dos jantares”. E nessa dança entre a teoria e a prática, repousa o livre e responsável exercício da Verdade.
Que fique claro que não somos contra o diploma, e nunca o fomos. Como falei, misturam-se entre nós, profissionais sem diplomas, os queridos profissionais formados, e em nenhum momento houve confrontos de idéias, e sim um profundo respeito, tanto pela carga teórica que esses profissionais carregam e que contribuem com a gente, e que ao mesmo tempo contribuímos com eles, pela experiência prática de décadas nas redações de jornais e nos setores de jornalismo das emissoras de rádio e de TV neste Estado, estas mesmas pelas quais Volney passou, muito antes de pensar em concluir algum curso de jornalismo.
O sr. Volney Oliveira, quando nos chama de preguiçosos, não está afetando somente os profissionais do futuro, mas também toda uma geração de personalidades que vivenciaram o jornalismo desde os tempos do Pinzônia (1895), onde transitaram no exercício da informação, grandes vultos como José Antonio Siqueira e Joaquim Francisco de Mendonça Junior, que foram os primeiros a militar nas comunicações aqui no Amapá desde a fase do Contestado Franco-Brasileiro até nossos dias.
O presidente do Sindicato dos Jornalistas chama de preguiçosos personalidade valorosas como o tenente-coronel Jovino Albuquerque Dinoá, o padre Júlio Maria de Lombaerde e o desembargador Jorge Hurley, que nos presenteou valorosas obras de pesquisa laboriosa, como a participação de Macapá nos conflitos cabanos, e as crônicas da cidade antiga, no inicio do século, retratadas pela pena do padre Júlio, no jornal Correio de Macapá.
Volney falta com o respeito a personalidades que foram figuras pioneiras na história do rádio e do jornal no Amapá, como Alcy Araújo, Pedro Silveira, Benedito Andrade, Aracy Mont’Alverne, Hélio Pennafort e outros... que já não pertencem mais a este mundo, e que seus nomes ficaram marcados pela grande contribuição que deram - mesmo não tendo diploma de jornalistas - a estes rincões do Amapá.
O senhor Volney Oliveira, que antes de freqüentar uma academia, foi iniciado no jornalismo exatamente pelas mãos daqueles que hoje chama de preguiçosos, e dá, como penitência, a relegação ao ostracismo, criando para todos eles um “leito de Procusto”, e impondo, até àqueles cansados, fatigados pela jornada de trabalho, a iniciação à Academia, como única forma de faze-los permanecer no exercício do jornalismo.
Mas também o senhor Volney tem o direito de sonhar e de falar besteiras, até mesmo de nada falar, pois é-lhe assegurado o direito de livre expressão, mesmo que nessa livre expressão seja manifestada - através de seus lábios - a mordaz vontade de exercitar a mesquinhez, a fúria e a deselegância àqueles que o ajudaram, no inicio, quando veio de mala e cuia da região do Baixo Amazonas, tentar a vida aqui. Hoje Volney esquece todos aqueles momentos de pioneirismo vividos em uma redação de jornal.
Mesquinhez e egoísmo sim.... simplesmente porque concluiu um curso acadêmico, não por seus próprios esforços, mas por empurrões e incentivos prestados à empresa em que trabalha. Nesse aspecto e nessas condições, ele teve o privilégio de estudar e concluir seu curso de jornalismo.
Mas temos que que dar um desconto ao senhor Volney. Temos que parabenizá-lo por ter tido esse privilégio de freqüentar e concluir uma faculdade de jornalismo. Ele teve o privilégio de ascender a uma direção sindical, e até mesmo outros privilégios, que nossa memória não é capaz de captar agora; não sei se é por preguiça de pensar.... mas temos que nos solidarizar com ele, por não ter tido um dos maiores privilégios que nem todos têm, mas que nem por isso, quem o tem fica a chamar os outros de preguiçosos: o privilégio da inteligência.
E graças a esse grande privilégio, que nossas personalidades do Jornalismo que já passaram por esta terra, contribuindo com seu empirismo e sua práxis, têm e continuarão a ter guarida na história da terra e na memória do povo, porque mesmo não tendo freqüentado banco de academia, exercitaram sua inteligência no registro cotidiano da crônica, e no exercício diário e constante da Verdade.
Estes, sim, sempre farão parte da história. Quanto ao senhor Volney, sua vida é uma lacuna fragmentada pelo seu egoísmo e corrompida pela sua consciência, pois sua nocividade para a história está exatamente em se ensimesmar na capsulização da vontade de uma oligarquia empresarial, em detrimento de muitos, que agora, e graças a Deus... não dependem mais de uma autorização sindical para que possam continuar o exercício profissional, agora de maneira definitiva, pois se ainda restar um pouquinho de inteligência do sr Oliveira, ele poderá perceber que a Justiça de nosso país ainda não decidiu a questão da obrigatoriedade do diploma; e ademais, graças a essa nossa própria Justiça, está na Constituição que nenhum profissional será cerceado de seu exercício em razão da edição de uma nova lei.
A grande diferença entre aqueles que pensam como o sr. Volney, e os jornalistas sem diplomas, é que a grande contribuição que estes jornalistas sem diploma deram à história da imprensa no Amapá não poderá ser resumida em resmas e resmas de papéis, e ainda faltarão páginas e páginas para registrar essas contribuições. Quanto à capacidade e inteligência do senhor presidente, ela só se resume e tem respaldo simplesmente num canudo de papel.
* Jornalista sem diploma