NASCE UM REI E ELE SE CHAMA; SACACA
O Largo de São João era só festa no dia 21 de agosto de 1926, no centro velho de Macapá nasce um menino que seria REI, sua vida foi uma festa, e na pia batismal ele recebe o nome de RAIMUNDO DOS SANTOS SOUZA, mais tarde tornou-se; O REI SACACA, ele foi coroado pelos deuses da mata com as bênçãos do POÇO DO MATO que desde criança aprendeu a reverenciar seus encantos e magias como profundo conhecedor de nossas ervas miraculosas.
SACACA era filho de Maximiano Antonio de Souza e Joaquina Emiliana dos Santos, foi aluno da professora Raimunda Mendes Coutinho, a famosa professora GUITA.
Como a lenha era produto econômico na década de vinte, SACACA desde cedo colaborava na manutenção da renda de sua família na companhia de seu pai, na extração da madeira, a qual era destinada a servir como combustível para alimentar as caldeiras da usina de eletricidade do antigo território do Amapá. E com isso a natureza foi parte integrante de sua vida, e SACACA, menino esperto desde “pirralho” foi conhecendo e descobrindo o valor das ervas medicinais.
A empresaria Sarah Roffe Zagury, possuía erisipela e contratou o jovem Raimundo para buscar raízes milagrosas que lhe beneficiassem, as quais ele conhecia o poder, em virtude da convivência rotineira e sabedora do seu profundo conhecimento, Dona Sara em uma das viagens a cidade de Macapá do cientista francês Paul Lecounte, apresentou-lhe o menino, comparando-o a uma SACACA, e Mestre Paul explicou que a expressão em si, traduzia o profundo conhecimento do menino e lhe outorga a alcunha por ser a definição de “Senhor da Floresta” e a partir de então; Raimundo dos Santos Souza tornou-se se o REI DA FAUNA E FLORA do Amapá. SACACA foi companheiro em vida de vários cientistas que aportaram por aqui, como: Waldomiro Gomes e foi funcionário da companhia aérea PAN AIR DO BRASIL, nos anos de 1942 a 1945, época que eclodia a segunda guerra mundial, e posteriormente transferiu-se para a Prefeitura Municipal de Macapá, sua função era fiscalizar as obras públicas e por seus conhecimentos foi convidado por Nilde Santiago para repassar sua vivencia e pratica com as ervas medicinais aos engenheiros agrônomos e florestais que trabalhavam no antigo campus avançado de Macapá. SACACA foi aclamado REI MOMO da cidade em 1975. A historia do negro SACACA confunde-se com as raízes de nossos afrosdescendentes, foi um dos fundadores do Banco da Amizade no coração do bairro do Laguinho e faleceu a 19 de setembro de 1999 na cidade de Macapá-AP.
02
TRIBUTO AO POÇO DO MATO I
Das entranhas da mata
Sangra tua vida,
Brota da terra
O suor de tua alma
POÇO DO MATO
Mata minha sêde
Mata os olhares de negros piedosos
Lava a alma dos pescadores
Do Igarapé das Mulheres descalças,
Banha os teus pés
E rendem-se as suas dores.
Mulheres negras com potes
Em cabeças sofridas
És tu oh! POÇO DO MATO
Acalanto para suas vidas.
03
TRIBUTO AO POÇO DO MATO II
Oh! Meu Poço do Mato
O martelar no prego
Das mãos de um ingrato invasor
Dói-me a alma, rasga-me o peito.
Escurece-me o olhar
O meu Poço do Mato no seu entorno
Desapareceu sobre as palafitas
Desordenadas, sumiram suas águas cristalinas,
E os velhos PIONEIROS
Sedentos de lembranças clamam por teu resgate.
Clamam por teu destino,
E pedem ao Deus da Mata
Punição para os invasores
E encantamento para suas vidas.
04
OS ENCANTOS DO POÇO DO MATO
A lata de manteiga bem ariada, é instrumento de trabalho de NEGA PIEDADE, rebolando as cadeiras ela desce preguiçosa e com ares de princesa de ébano as ladeiras que circundam o POÇO DO MATO, cantarola sem letra uma canção indecifrável aos ouvidos de mortais.
Retira com cuidado os cipós que atrapalham o caminho e segue sorrateira como uma cobra a dar o bote, no lado esquerdo um pedaço de pano no ombro, puído pelo tempo e no braço direito à famosa lata serviria para levar o liquido precioso para os patrões degustarem após a ceia matinal e para os afazeres domésticos.
NEGRA PIEDADE brilha na sua cor lustrada pelos raios dourados que banham aquela manhã e ela faz parte de uma aquarela. O POÇO DO MATO tornou-se inatingível, distante, e a NEGRA no viço da idade não percebe, o canto do pássaro é companhia, e a caminhada longa. Ela levanta a blusa, mostra seus seios rijos ao sol e enxuga o suor.
Ao abrir os olhos o POÇO DO MATO surge como por encanto a sua frente e suas águas jorram como faíscas prateadas lavando o céu.
PIEDADE é só alegria, suas companheiras não apareceram e ela agradece por não ter que dividir espaço com ninguém em busca de água. A negra furtiva e exausta da caminhada observa se alguém se aproxima, o suor é forte nas entranhas, o cabelo carapinha, o calo nos pés são esquecidos por um momento e ela entrega-se aos sonhos sentada, ao redor do POÇO DO MATO encantado dos Campos do Laguinho.
O moço branco de camisa engomada, perfume francês estende-lhe as mãos e PIEDADE não recusa seu convite, levanta-se assanhada, arruma os cabelos, ensaia o seu sorriso mais branco, balança as cadeiras, empina os seios num frenesi e exclama: sou toda sua Sinhô. O moço ergue-a do solo, levita com ela naquele cenário e PIEDADE emudece, os pássaros continuam a cantar, as arvores deslizam suavemente ao balançar do vento e a brisa que sopra não a desperta. O POÇO DO MATO á a única testemunha da NEGRA PIEDADE e cúmplice em seu prazer carnal, as horas são intermináveis e preocupam os seus patrões, os seus vizinhos e os conhecidos da NEGRA PIEDADE.
Escurece e PIEDADE não voltou, os moleques correm pelo mato a procura da negra, porém, nem sinal. A noticia se espalhou, o seu sumiço é comentado em todas as esquinas, e a população do bairro da Favela e do Elesbão ficam estarrecidas. As lavadeiras e as carregadeiras de água junto com as moças virgens são proibidas de ir ao Poço do Mato sozinhas, por quê?
NEGRA PIEDADE FOI ENCANTADA.
05
O NEGRO AVHULU
O navio negreiro parte da Mazagão africana abarrotado de negros de varias partes do continente, sussurrando nas ondas de um MAR ACIMA, MAR ABAIXO (Marabaixo), sentado sobre caixotes com pose de príncipe, lá está ele: o NEGRO AVHULU, ele não compreende os vários idiomas tribais, foi arrancado do seio pátrio por caçadores e mercadores de escravos, e procura apesar da baixa estatura entender a situação.O murmúrio dos companheiros não o irrita, o soluçar das mães que deixaram seus filhos arrancados de seus braços o entristece e AVHULU enxuga sorrateiramente uma lagrima, porem, permanece estático sem compreender tudo aquilo.
O bairro do Laguinho foi para o NEGRO AVHULU uma segunda pátria, ele se aconchegou com os novos amigos, a cor era a mesma os costumes similares, mas a saudade nunca desapareceu.
O POÇO DO MATO foi para o NEGRO AVHULU seu confidente, só ele sabia das suas tristezas, suas lagrimas misturavam-se com as lagrimas que brotavam da terra, umas caiam de um rosto negro, e as outras surgiam do seio da mata, misturando-se no buraco do poço, e ele fazia seus pedidos, acreditando que no fundo do poço havia um caminho que o levaria de volta ao seu País.
Varias vezes segundo relato de PIONEIROS o Negro Avhulu pensou em pular no poço acreditando que se libertaria das saudades, porém seu gesto nunca se concretizou. Como o POÇO DO MATO o NEGRO AVHULU. Descendente de nobres holandeses se eternizou e foi encantado.